Marcela Teatin Latancia (foto), do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, é primeira autora de estudo selecionado para apresentação em pôster no AACR 2021 que investiga o papel das polimerases de síntese translesão na resistência à temozolomida em células de glioma. O trabalho rendeu à pesquisadora o reconhecimento da AACR com o Global Scholar-in-Training Awards (GSITA), prêmio oferecido a especialistas em início de carreira.
As DNA polimerases de Síntese Translesão são enzimas capazes de replicar o DNA danificado sem remover lesões, este mecanismo é conhecido por tolerar o dano no DNA. “As células tumorais podem usar esse mecanismo para sobreviver às lesões causadas por quimioterápicos e, portanto, manter as lesões no DNA”, explicam os autores. “Esse processo de Síntese Translesão está sujeito a erros e pode levar à mutagênese, aumentando o potencial de resistência das células tumorais”, esclarecem os autores.
No estudo, a pesquisadora tratou linhagens de células de fibroblastos POLH mutadas (originadas de pacientes com Xeroderma Pigmentosum), analisaram o ciclo celular por citometria de fluxo, a viabilidade celular por um ensaio colorimétrico (XTT) e a sobrevivência por marcadores apoptóticos (como sub-G1) e ensaios clonogênicos. “Observamos que essas células com mutação em POLH são mais sensíveis à temozolomida, indicando que os mecanismos de síntese por translesão são importantes para superar os danos ao DNA”.
Também foram construídas células knockout U251-MG, linhagens de células de glioma, pelo sistema CRISPR / CAS9 para os genes das enzimas Polimerase Kappa (POLK) e Polimerase Iota (POLI), que também são polimerases da síntese de translesão do DNA. Essas mutações foram validadas usando o sequenciamento Sanger e as mutações resultaram em códons de parada prematuro. Dados obtidos pelo TCGA também foram usados para analisar a expressão de TLS em pacientes com glioblastoma. “Curiosamente, em pacientes com recidiva, quando foram tratados com temozolomida, observamos que há um aumento da expressão de POLK, de forma significativa”, observaram os autores.
Estas células com mutação em POLI e POLK tiveram diminuição da viabilidade após o tratamento com temozolomida. Além disso, o estresse genotóxico, conforme indicado pelo H2AX fosforilado, aumentou nas células tratadas com temozolomida e foi ainda maior nas células mutadas em comparação com as células não mutadas. “Também é possível observar a parada do ciclo celular, principalmente na fase G2, após 48 h em todas as três células mutadas, o que não é observado nas células controle do tipo selvagem”, esclarecem. “Isso é um dado intrigante, uma vez que essas enzimas comumente atuam em fase S, e não em fase G2 do ciclo celular”.
Para analisar mais de perto a replicação do DNA, os pesquisadores também realizaram o ensaio de fibra de DNA, e surpreendentemente não houve diferença entre as células mutadas células selvagens, após o tratamento com temozolomida. Apesar disso, observaram que a mutação em POLK por si só levou à diminuição de fibras de DNA, o que pode prejudicar o avanço da forquilha de replicação.
“Podemos inferir que as polimerases TLS protegem as células tumorais do dano de DNA induzido por temozolomida e, portanto, desempenham papéis importantes na resistência a essa droga. Como perspectivas para este trabalho, pretendemos observar mais detalhadamente como a replicação é afetada nessas células mutadas tratadas com temozolomida, uma vez que existe uma semelhança na progressão da forquilha de replicação após tratamento com TMZ e a não observação da parada de ciclo celular em fase S, mas sim em fase G2 podem indicar que essas polimerases atuam em outros contextos de vias de reparo nesse contexto, ainda não descrito”, afirmam.