O oncologista brasileiro Rodrigo Taboada (foto), do A.C.Camargo Cancer Center, foi um dos dez jovens especialistas escolhidos pela Sociedade Europeia de Oncologia para receber o Young Investigator Award na ESMO GI 2020. O prêmio foi concedido pelo estudo que comparou as características clínico-patológicas e moleculares de carcinomas e tumores neuroendócrinos de alto grau.
“Acredito que esta premiação pode fomentar novas parecerias e projetos, o que é fundamental quando se estuda doenças raras”, avalia Taboada.
Em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) subclassificou as neoplasias neuroendócrinas gastroenteropancreáticas de grau 3 (NEN GEP G3) em carcinomas neuroendócrinos (NEC) ou tumores neuroendócrinos (G3 NET). No entanto, ainda existem poucos dados sobre perfis clínicos e moleculares das neoplasias neuroendócrinas G3.
O oncologista esclarece que o estudo avalia neoplasias neuroendócrinas de alto grau do trato gastrointestinal, tumores muito raros e mais agressivos do que sua contraparte de baixo grau. “Por serem raros e agressivos há uma necessidade de um maior conhecimento sobre eles. Nesse contexto, o nosso estudo buscou identificar características moleculares que futuramente possam ser úteis como alvos para tratamentos. Nossa contribuição veio em um momento oportuno, tendo em vista a nova classificação dos tumores neuroendócrinos oficializada em julho do ano passado”, destaca.
Os autores coletaram retrospectivamente dados de todos os pacientes com neoplasias neuroendócrinas gastroenteropancreáticas de grau 3 diagnosticados e tratados no A.C.Camargo entre 2000 e 2019. Os casos com tecidos tumorais disponíveis foram revisados e reclassificados de acordo com a classificação da OMS 2019.
Os tecidos de neoplasias neuroendócrinos fixados em formalina e embebidos em parafina tiveram o DNA extraído para criação de perfil genômico por meio do sequenciamento de próxima geração (NGS), que avaliou perfis de mutações, carga de mutação tumoral (TMB) e presença de instabilidade de microssatélites. O endpoint primário foi a sobrevida desde o início do tratamento.
Foram incluídos 77 pacientes com mediana de idade ao diagnóstico de 56 anos (26-91); 62% (48/77) eram do sexo masculino. Os locais de tumor primário mais comuns foram estômago (27%, 21/77), pâncreas (23%, 18/77) e NEN de primário desconhecido (23%, 18/77). A doença metastática estava presente em 69% dos pacientes no momento do diagnóstico e 91% desenvolveram metástase.
Entre 77 pacientes, 43 (56%) tiveram revisão patológica: 29 casos foram carcinomas neuroendócrinos (NEC; 67%) e 14 foram reclassificados como tumores G3 NET (33%), com uma alteração no diagnóstico de 23%. Em um seguimento mediano de 44 meses, a mediana de sobrevida global no G3 NET digestivo não pancreático, no G3 NET pancreático e no GEP NEC foi de 23,7, 55,6 e 10,8 meses, respectivamente (G3 NET não pancreático vs NEC, p <0,01).
A mediana de sobrevida global no G3 NET com ki67> 55%, NEC 55% foi de 19, 25 e 8 meses, respectivamente. Na análise multivariada da regressão de Cox, apenas a diferenciação celular foi mantida como risco de morte (HR 3,14 NEC vs G3 NET; P = 0,025). O NGS foi realizado em 42% (32/77) dos casos: 21 NEC e 11 G3 NET.
A carga média de mutação tumoral foi de 5,67 (0-66,82) mutações por megabase entre os NEC e 4,52 (0-8,83) entre os G3 NET. Três (14,3%) casos de NEC apresentavam instabilidade de microssatélites em comparação com nenhum caso entre os pacientes G3 NET. Os genes mutados mais comuns em G3 NET foram TP53 (N=3; 27,3%), CDKN2A (N=3; 27,3%) e KRAS (2/11, 18,2%); entre os NEC, os genes mutados mais comuns foram TP53 (N=15; 71,4%), Rb1 (N=7; 33,3%), PTEN (N=6; 28,6%) e APC (N=4; 19%).
“O G3 NET digestivo não pancreático está associado ao aumento da sobrevida em comparação com o NET. A revisão patológica é essencial para estimar o prognóstico e, consequentemente, o plano terapêutico, pois parte do G3 NET pode ser tratada como G2 NET. Enquanto G3 GEP NEN geralmente abriga baixa carga de mutação tumoral e menos mutações acionáveis, 14% dos casos de NEC eram microssatélites instáveis e poderiam se beneficiar de inibidores de checkpoint imune”, concluíram os autores.
Referência: Clinical, pathological and molecular profiles of G3 neuroendocrine tumors and neuroendocrine carcinomas - R. Taboada, L. Claro, T. Felismino, F. Campos, V. Jesus, M. Barros e Silva, R. Riechelmann AC Camargo Cancer Center, Sao Paulo, Brazil - https://doi.org/10.1016/j.annonc.2020.04.468