Embora a triagem de genes de predisposição ao câncer (GPC) esteja atualmente bem estabelecida para cânceres hereditários comuns, pouco se sabe sobre seu papel nos tumores neuroendócrinos (TNEs), além das síndromes já descritas. Estudo brasileiro apresentado em Sessão Oral na ESMO GI pela oncologista Rachel Riechelmann (foto) buscou definir a frequência de variantes patogênicas e provavelmente patogênicas de GPC em jovens adultos com TNEs.
Este estudo examinou prospectivamente pacientes abaixo de 40 anos sem histórico conhecido de síndromes de predisposição hereditária ao câncer, que foram analisados consecutivamente para variantes de linhagem germinativa em um painel de 113 GPC de penetrância alta a moderada.
Foram elegíveis pacientes com 18 anos ou mais e diagnóstico histológico confirmado de TNEs de qualquer grau, estágio e local de origem. Todos os dados clínicos, incluindo histórico familiar de câncer, foram recuperados de registros médicos eletrônicos e / ou de entrevista com o paciente.
As variantes identificadas através do sequenciamento de próxima geração (NGS-NextSeq 500, Illumina) foram classificadas de acordo com os critérios do American College of Medical Genetics.
Resultados
De julho de 2018 a outubro de 2019, 66 pacientes foram incluídos: os TNEs mais comuns foram pâncreas (26) e intestino médio (18).
Da população avaliada, 14 (21,2%) apresentaram variantes patogênicas e provavelmente patogênicas: MUTYH (3: pâncreas, midgut, gástrico), XPC (2: pâncreas, rim), 1 ERCC2 (midgut), FH (reto), POLE (cólon), SLX4 (pâncreas), MEN1 (pâncreas), CHEK2 midgut), SDHB (primário desconhecido), ERCC3 (gástrico) e ERCC3 mais MUTYH (apêndice).
“A maioria dos jovens adultos com TNE tem histórico familiar de câncer (quase 70%). Cerca de 1/5 apresenta linhagem germinativa patogênica ou provavelmente patogênica em genes de predisposição hereditária, com a maior parte dos genes afetados envolvido nos mecanismos de reparo do DNA. Midgut e pâncreas foram os sítios tumorais mais frequentes”, destacam os autores, esclarecendo que essas mutações na linhagem germinativa foram semelhantes em termos de sexo e idade de início da doença quando comparadas a casos esporádicos.
Os achados atuais corroboram dados já apresentados pelo mesmo grupo e devem motivar futuras análises sobre a frequência e o tipo de variantes genômicas de linhagem germinativa em TNEs de início precoce. “Vamos expandir a coorte para um total de 200 pacientes cujas amostras biológicas já estão coletadas e armazenadas em nosso biobanco”, sinalizam os pesquisadores.
"A pesquisa de mutações germinativas é uma área em expansão em tumores sólidos. No entanto, em tumores neuroendócrinos ainda há pouca informação.Nosso estudo, conduzido pelo Centro Internacional de Pesquisa do A.C.Camargo, com o grupo da pesquisadora Giovana Torrezan, traz insights sobre a carcinogênese de TNE, especialmente entre jovens. Contudo, precisamos aprofundar a pesquisa e avaliar se há perda de heterozigose nos respectivos tecidos tumorais dos pacientes com mutações germinativas. Se confirmada, o estudo abre a oportunidade para testarmos drogas-alvo nesses pacientes", conclui Rachel.
Referência: Young adults with neuroendocrine tumors present high rate of pathogenic or likely pathogenic germline variants in cancer predisposing genes - Rachel P. Riechelmann et al.