Os médicos especialistas em radioterapia Rejane Franco, do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, e Gustavo Nader Marta, do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, são coautores de estudo de coorte retrospectivo que avaliou a influência da demora no início da radioterapia adjuvante na evolução locorregional de pacientes com câncer de cabeça e pescoço. O trabalho foi selecionado para apresentação em pôster no Congresso da Sociedade Europeia de Radioterapia e Oncologia (ESTRO 2020).
A radioterapia tem um papel importante no tratamento de pacientes com tumores de cabeça e pescoço, sendo frequentemente utilizada como terapia adjuvante com o objetivo de diminuir as taxas de recorrência locorregional e aumentar a sobrevida global dos pacientes com doença localmente avançada. Além dos fatores tumorais clínicos, o prognóstico também pode ser afetado por variáveis terapêuticas, como o tempo total de tratamento e o intervalo de tempo entre a cirurgia e a radioterapia adjuvante. No entanto, não está claro o momento ideal para iniciar a radioterapia após a cirurgia com intenção curativa sem comprometer os resultados oncológicos.
No estudo, os pesquisadores incluíram pacientes com diagnóstico de carcinoma espinocelular de cabeça e pescoço submetidos à ressecção cirúrgica com intenção curativa seguida de radioterapia, com ou sem quimioterapia adjuvante, entre janeiro de 2009 e janeiro de 2015.
O intervalo de tempo foi considerado da data da cirurgia até o início da radioterapia e dicotomizado pelo método da curva ROC ao 92º dia. Possíveis fontes de heterogeneidade também foram avaliadas por meio de análise de regressão, considerando os potenciais efeitos de outras variáveis sobre o desfecho locorregional.
Resultados
Foram avaliados 168 pacientes, a maioria homens (n = 132; 78,6%), com diagnóstico de câncer de cavidade oral (n = 95; 56,5%) e mediana de 62 anos de idade (intervalo de 41-92 anos). Cerca de 93% tinha doença localmente avançada estádio clínico III/IV. A análise univariada mostrou que os seguintes fatores estatisticamente significantes foram relacionados ao controle locorregional: invasão angiolinfática (p = 0,055), invasão perineural (p <0,001), linfonodos positivos (p ≤ 0,001), extensão nodal extracapsular (p = 0,014), comprimento de RT <30 dias (p = 0,001), dose de radiação no leito do tumor <60 Gy (p = 0,03) e KPS antes de RT <70 (p = 0,001).
A análise multivariada mostrou KPS <70 (HR = 2,058; 95% IC: 1,060-3,992; p = 0,033), dose de radiação no leito tumoral <60 Gy (HR = 6,523; 95% IC: 2,266-18,777; p = 0,001), linfonodos positivos (HR = 3,339; 95% IC: 1,350-8,255; p = 0,009) e invasão perineural (HR = 3,529; 95% IC: 1,236-10,074; p = 0,018) como variáveis independentes de controle locorregional inferior.
A taxa de sobrevida livre de recidiva foi de 66,4% para pacientes que iniciaram a radioterapia com mais de 92 dias de pós-operatório versus 75,4% para aqueles que iniciaram RT em até 92 dias (p = 0,377).
Pacientes cujo tempo total de tratamento (período entre a data da cirurgia até o último dia de radioterapia) foi superior a 150 dias tiveram uma taxa de recorrência locorregional de 41,8%, enquanto nenhum paciente com duração do tratamento inferior a 150 dias apresentou recidiva (p = 0,001).
“O intervalo entre a cirurgia e a radioterapia não mostrou influência nas taxas de controle locorregional em pacientes com câncer de cabeça e pescoço. No entanto, doses <60 Gy, e o tempo total de tratamento <150 dias foram associados a menores taxas de controle locorregional”, concluíram os autores.
Referência: PO-0811 Influence of time between surgery and postoperative radiation therapy in head and neck cancer - Rejane Franco, Leandro Luongo de Matos, Marco Aurélio Vamondes Kulcsar, Gilberto de Castro-Júnior, Gustavo Nader Marta