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AtualizadoQua, 15 Maio 2024 8pm

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II Semana Brasileira da Oncologia

O papel do tecido na era da biópsia líquida

scapulatempo semana bxO papel do tecido na era da biopsia líquida foi tema da apresentação do patologista Cristovam Scapulatempo (foto), gerente de inovações em Patologia e Patologia Molecular do Grupo DASA, durante a II Semana Brasileira da Oncologia. A discussão integrou a sessão educacional sobre ‘Atualização em Diagnóstico Molecular’. Confira a síntese do especialista.

Por Cristovam Scapulatempo

Toda a medicina moderna começou a ser moldada com base nas correlações entre sintomas e achados de necropsias no século VXIII por Giovanni Battista Morgagni, e com os achados microscópicos Rudolph Virchow começou a relacionar os achados celulares com as doenças, sendo considerado o pai da patologia moderna. A partir de então, novas entidades foram sendo descritas. Com a evolução da ciência, teve início a caracterização proteica das neoplasias. Posteriormente, com o surgimento das tecnologias genômicas, as neoplasias passaram a ser subclassificadas de acordo com os achados moleculares.

Os achados moleculares ainda não são tratáveis, ou seja, não são alvos, e nem sempre nos ajudam a redefinir o tratamento da maioria dos tumores. O diagnóstico histopatológico é o exame que contém todas as informações como tipo tumoral, fatores prognósticos e preditivos, e ainda hoje é o exame que possibilita a informação mais importante para orientação do tratamento da maioria dos tumores.

Sabemos ainda que durante a evolução tumoral mutações clonais e subclonais começam a acontecer e quando pensamos em tratar os pacientes com tumores avançados temos que ter em mente a necessidade de detectarmos a maioria dessas mutações que podem ter algum impacto no tratamento.

Dependendo do tipo do tumor a cada progressão seria ideal termos uma nova amostra tecidual, mas infelizmente nem sempre isso é possível, seja pela dificuldade de ter acesso a uma biópsia ou mesmo pelas condições clínicas dos pacientes.

Nesse contexto, a biópsia líquida é uma ferramenta fantástica que pode nos dar informações acerca da heterogeneidade tumoral utilizando apenas sangue periférico e em poucos dias pode ser informativa para uma tomada de decisão importante. O grande problema é que a detecção do DNA tumoral circulante (ctDNA) tem vários limitantes, sendo o mais importante a quantidade no plasma. Sabemos que tumores de diferentes órgãos têm capacidades diferentes de liberação de ctDNA, o que pode ser dependente do tipo histológico (carcinomas mucinosos liberam menos) e também do índice de proliferação (tumores altamente proliferativos têm mais células em apoptose, logo maior quantidade de ctDNA).

A maioria das biópsias líquidas disponíveis no mercado tem excelente especificidade, entretanto os limites de detecção ainda não sejam tão baixos. Isso é um problema porque quando falamos em tumores avançados, se fizermos um corte em 2% de frequência alélica (VAF), cerca de 16% dos cânceres colorretais, 26% dos cânceres de pâncreas e 45% dos cânceres de pulmão não seriam detectados. Assim, é preciso ter em mente que frente a um resultado positivo na biópsia líquida temos a certeza que detectamos algo, e quando negativo, temos que entender que pode ser que o tumor tenha alguma outra alteração genômica que devemos procurar no tecido.

Temos outros pontos importantes a discutir sobre a biópsia líquida. Atualmente, muito se discute sobre a biopsia líquida para detecção de mutações que nos permitiriam alterar o tratamento baseado em alterações em genes alvos. Entretanto, temos um novo tipo de biopsia líquida que tem a finalidade de monitoramento molecular da doença, que para ter uma altíssima sensibilidade (VAF de 0,01%) seleciona um pool de 16 mutações somáticas detectadas após a subtração das mutações germinativas encontradas através do exoma germinativo e somático (tumoral) do paciente. Esse tipo de exame permite em tempo real monitorarmos a doença molecular residual, seja após a cirurgia, quimioterapia ou imunoterapia. O teste detecta tumores de mama 16 meses antes da detecção da recidiva radiológica e já mostrou aumentar a sobrevida em pacientes com câncer colorretal quando se trata sistemicamente a recidiva molecular tumoral.

O segundo ponto que é preciso observar é que quanto maior a sensibilidade do teste utilizado como biópsia líquida, é possível detectar alterações que estão num clone pequeno de células que talvez não estaria presente na maioria das células tumorais, limitando assim a efetividade da terapia alvo escolhida. Entretanto, sabemos que quando há concordância dos achados do tecido e da biópsia líquida os resultados são muito melhores.

Por fim, quando pensamos em tratar pacientes com doença avançada, sem definição do sítio de origem e histologia tumoral, baseado em achados moleculares de uma biópsia líquida, podemos dar um tiro no escuro, muitas vezes sem sucesso, pois nem todos os marcadores são agnósticos e também porque múltiplos tumores de diferentes sítios podem ter a mesma mutação, e uma droga alvo dirigida a essa alteração molecular não funciona, necessariamente, nos diferentes tipos tumorais.

Em conclusão, o diagnóstico anatomopatológico ainda é fundamental para um adequado tratamento oncológico. O tecido tumoral submetido a painéis de NGS ainda é o material que contém mais informações e associação com resposta ao tratamento. Entretanto, a biopsia líquida é uma ferramenta excelente que quando utilizada para monitoramento molecular tem desempenho melhor que qualquer outro exame, e também é uma ferramenta muito útil quando utilizada para diagnosticar mecanismos de resistência ou na detecção de novas mutações de sensibilidade. Vale observar que ainda estamos aprendendo a utilizar, principalmente quando pensamos num cut off para decisão terapêutica para que tenhamos melhores respostas clínicas.

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