Realizado durante o XXI Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica, o curso de oncogenética destacou duas classes de biomarcadores genômicos agnósticos, a instabilidade de microssatélites (MSI, do inglês Microsatellite Instability) e a carga mutacional (TMB, do inglês Tumor Mutational Burden). O assunto foi tema da apresentação de Gabriel Macedo (foto), Coordenador do Programa de Medicina Personalizada do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Por Gabriel Macedo, Coordenador do Programa de Medicina Personalizada, Hospital de Clínicas de Porto Alegre
Microssatélites são sequências repetitivas do genoma altamente propensas ao acúmulo de mutações. A estabilidade no número destas repetições ao longo das divisões celulares é mantida pelo sistema de reparo de mal pareamento de DNA (MMR, do inglês Mismatch Repair), uma via que integra inúmeras enzimas, incluindo MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2. Variantes germinativas nestes genes são a causa mais comum da síndrome de Lynch, uma síndrome de predisposição hereditária ao câncer colorretal e de endométrio, principalmente. Portanto, tumores que ocorrem nestes pacientes apresentam como característica o fenótipo de MSI em decorrência de uma deficiência constitutiva no sistema MMR.
Nos últimos anos, outros mecanismos associados a MSI também foram descritos. Mutações nos genes POLD1 e POLE, ambos codificadores de polimerases que mantêm a fidelidade da replicação do DNA, também estão associadas ao fenótipo de MSI. Alterações nestes genes ocorrem em até 15% dos tumores de endométrio e melanoma e em 7% dos casos de câncer colorretal.
Outro aspecto envolve o uso das plataformas de sequenciamento de nova geração para identificação de MSI. Alguns estudos vêm demonstrando que esta não é uma característica dicotômica, mas um gradiente de instabilidade em que diferentes níveis de MSI parecem associar-se com prognóstico e resposta ao tratamento. O conhecimento do impacto preditivo deste biomarcador na resposta aos inibidores de checkpoint imunológico (ICIs) também representa avanço importante. Tumores com MSI têm uma resposta superior a alguns ICIs devido a maior apresentação de neoantígenos e consequente expansão da população de linfócitos T reativos aos antígenos tumorais.
A MSI também se correlaciona com um segundo biomarcador agnóstico, o TMB. O TMB representa o número de mutações não sinônimas (mutações em que ocorrem trocas de aminoácidos na proteína) acumuladas em um determinado tumor. Este fenômeno é mais comum em cânceres como pulmão, melanoma e bexiga, e raro em tumores pediátricos. Mais de 90% dos tumores com MSI também apresentam alto TMB. Apesar deste último biomarcador também correlacionar-se com reposta a ICI, alguns estudos já demonstram que fatores como a clonalidade das mutações, presença de linfócitos T CD8+ na periferia e infiltrando o tecido neoplásico, bem como a variabilidade do repertório de receptores de células T também influenciam na resposta aos ICI. Estudos clínicos prospectivos avaliando a combinação destes fatores serão necessários para confirmar o impacto preditivo destes algoritmos na identificação de pacientes com alta probabilidade de resposta.
Por fim, novas evidências apontam para o uso de cutoffs de TMB dependentes da histologia. Harmonização nos métodos de detecção deste biomarcador também será fundamental para o maior sucesso da identificação de pacientes candidatos ao uso de ICI.