O ensaio clínico Women’s Health Initiative (WHI) avaliou a modificação alimentar em quase 49 mil mulheres na pós-menopausa sem antecedentes de câncer de mama e demonstrou que aquelas que seguiram uma dieta balanceada e com baixo teor de gordura apresentaram 21% menos risco de morte por câncer de mama na comparação com o grupo controle, sob dieta normal.1 Este é o primeiro grande estudo clínico randomizado a mostrar que a dieta pode reduzir o risco de morte por câncer de mama. O trabalho será apresentado na ASCO 2019. O oncologista Antonio Carlos Buzaid (foto), diretor médico geral do Centro de Oncologia da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, e membro do comitê gestor do Centro de Oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein, comenta os resultados.
Estudos observacionais sobre o consumo de gordura na dieta e sua relação com o câncer de mama têm resultados inconsistentes. O estudo clínico Dietary Modification (DM) da Women’s Health Initiative (WHI) buscou avaliou a influência do padrão dietético de baixo teor de gordura na incidência e nos desfechos do câncer de mama.
"Até hoje, a base de evidências era apoiada essencialmente em estudos observacionais. Ter um estudo clínico randomizado traz, sem dúvida, uma informação com força de evidência muito mais robusta", afirmou a oncologista Monica Bertagnolli, presidente da ASCO.
A incidência da obesidade aumentou drasticamente nas últimas décadas, e se as tendências atuais continuarem ao longo dos próximos 20 anos, estima-se que a obesidade leve a mais de 500 mil casos adicionais de câncer a cada ano nos Estados Unidos.2 Além disso, a maioria da população ainda não reconhece a obesidade como um fator de risco para a doença3, o que motivou a ASCO a identificar a “Redução do Impacto da Obesidade na Incidência e Resultados do Câncer” como uma prioridade crítica de pesquisa.4
Sobre o estudo
Iniciado em 1993, o Women’s Health Initiative (WHI) é um conjunto de ensaios clínicos randomizados e controlados em andamento que estuda métodos de prevenção de doenças cardíacas, câncer de mama e câncer colorretal, e fraturas osteoporóticas em mulheres na pós-menopausa.
A análise apresentada na ASCO 2019 vem do ensaio clínico randomizado, controlado, WHI de modificação da dieta. Realizado em 40 centros nos Estados Unidos, o trabalho envolveu 48.835 mulheres na pós-menopausa com idades entre 50 e 79 anos, sem história prévia de câncer de mama. Entre 1993 e 1998, os pesquisadores distribuíram aleatoriamente mulheres à sua dieta habitual (60%), onde a gordura foi responsável por 32% ou mais de suas calorias diárias, ou uma dieta com o objetivo de reduzir o consumo de gordura a 20% ou menos da ingestão calórica (40%), além de incentivar pelo menos uma porção de vegetais, frutas e grãos em suas dietas diárias.
As mulheres do grupo de dieta balanceada e com baixo teor de gordura aderiram à dieta por aproximadamente 8,5 anos. Os investigadores continuaram a seguir todas essas mulheres após a conclusão do período de intervenção para verificar a morte por qualquer causa ou em decorrência do câncer de mama.
Resultados
A intervenção dietética reduziu significativamente a ingestão de gordura; aumentou a ingestão de frutas, legumes e grãos e proporcionou modesta perda de peso (3%; todos P <0,001).
A maioria das mulheres do grupo de dieta balanceada e com baixo teor de gordura reduziu o consumo diário de gordura para 25% ou menos e aumentou a ingestão de frutas, verduras e grãos.
Durante 8,5 anos de intervenção dietética, houve 8% menos cânceres de mama e mortes por câncer de mama foram um pouco menores no grupo de intervenção, mas as taxas não foram significativamente diferentes. No entanto, os óbitos após o câncer de mama (câncer de mama seguido de morte por qualquer causa) foram significativamente reduzidos no grupo de intervenção, ambos durante a intervenção (HR 0,65 95% CI 0,45-0,95) e 16,1 anos (mediana) de acompanhamento cumulativo.
Até o momento, o estudo acompanhou as participantes por uma mediana de 19,6 anos, e 3.374 casos de câncer de mama foram diagnosticados no grupo entre 1993 e 2013.
No total, as mulheres do grupo de intervenção experimentaram uma série de benefícios de saúde a curto e longo prazo, em comparação com as mulheres do grupo de dieta normal.
Os resultados da análise demonstraram um risco 15% menor de morte por qualquer causa após um diagnóstico de câncer de mama no grupo de dieta balanceada e com baixo teor de gordura (1.011 mortes, HR 0,85 95% CI 0,74-0,96). Em relação à morte específica por câncer de mama, houve um risco 21% menor no grupo da intervenção (383 mortes, HR 0,79 95% CI 0,64-0,97).
"Este é o maior estudo que demonstra de modo inequívoco que uma simples intervenção nutricional pode reduzir o risco de morte por câncer de mama (e outras causas) de magnitude semelhante à uma quimioterapia adjuvante. Orientação dietética para todas as pacientes deve fazer parte da rotina do oncologista clínico", observa Buzaid.
Os pesquisadores coletaram amostras de sangue das mulheres no baseline e continuarão a coleta periodicamente para que possam acompanhar a saúde das mulheres com base em uma variedade de biomarcadores sanguíneos.
O estudo recebeu financiamento do National Institutes of Health (NCT00000611).
Referências
1 - Abstract 520: Low-fat dietary pattern and long-term breast cancer incidence and mortality: The Women’s Health Initiative randomized clinical trial - Rowan T. Chlebowski et al
Presentation Information
Breast Cancer—Local/Regional/Adjuvant Poster Discussion Session
Sunday, June 2, 2019: 8:00-11:00 a.m., McCormick Place, Hall A
Sunday, June 2, 2019: 4:30-6:00 p.m. McCormick Place, Hall D2
2 - National Cancer Institute: Take action to decrease your cancer risk: Obesity and its role in cancer health disparities. https://www.cancer.gov/aboutnci/organization/crchd/blog/2015/nmhm15-spotlight
3 - ASCO: ASCO 2018 Cancer Opinion Survey. https://www.asco.org/sites/new-www.asco.org/files/content-files/research-and-progress/documents/2018-NCOSResults.
4 - ASCO: Nine Research Priorities to Accelerate Progress Against Cancer. https://www.asco.org/research-progress/reports-studies/clinical-cancer-advances-2019/nineresearch-priorities-accelerate