O tratamento adjuvante do câncer de mama triplo-negativo em estágio inicial com o agente quimioterápico capecitabina não melhorou significativamente a sobrevida global ou a sobrevida livre de doença em comparação com a observação. Os dados do estudo randomizado de fase III GEICAM/CIBOMA foram apresentados no 2018 San Antonio Breast Cancer Symposium por Miguel Martín (foto), professor e chefe do Serviço de Oncologia Médica do Hospital Gregorio Marañón, Universidad Complutense, em Madri, Espanha. O trabalho contou com a participação de especialistas brasileiros.
O câncer de mama triplo-negativo (TNBC) tem um risco maior de recidiva em comparação com outros tumores da mama. "Pacientes com câncer de mama triplo-negativo em estágio inicial geralmente são tratados com cirurgia e quimioterapia, e às vezes radioterapia. No entanto, novas abordagens terapêuticas são urgentemente necessárias, porque o risco de recidiva é alto: 7 a 10% daqueles com doença estádio I; 15 a 20% dos pacientes com doença estádio II; e 25 a 50% daqueles com doença estádio III”, disse Martín.
CIBOMA/2004-01_GEICAM/2003-11 é um estudo multinacional, randomizado, de fase III, que explora a capecitabina adjuvante (X) após o término do tratamento padrão em pacientes com câncer de mama triplo-negativo inicial. Os pacientes elegíveis tinham câncer de mama inicial, operável, linfonodo positivo (ou linfonodo negativo com tamanho de tumor ≥ 1 cm), receptor hormonal negativo, HER2 negativo, e receberam 6-8 ciclos de antraciclina padrão e/ou quimioterapia contendo taxano ou 4 ciclos de doxorrubicina-ciclofosfamida (para doença nódulo negativo) no cenário (neo) adjuvante.
Os pacientes foram randomizados para 8 ciclos de capecitabina (1.000 mg/m2 bid, dias 1-14, a cada 3 semanas) ou observação. Os fatores de estratificação incluíram centro, terapia anterior baseada em taxano, número de linfonodos axilares envolvidos e fenótipo (basal versus não basal, de acordo com as citoqueratinas 5/6 e/ou positividade para EGFR).
O objetivo primário foi comparar a sobrevida livre de doença (SLD) entre ambos os braços de tratamento, e objetivos secundários incluíram a comparação em termos de SLD em 5 anos, sobrevida global (SG) e segurança.
Resultados
O recrutamento de 876 pacientes de 8 países foi concluído em setembro de 2011. A mediana de idade foi de 49 anos; 68,5% dos pacientes estavam na pós-menopausa, 55,5% eram linfonodo negativos, 71,7% tinham fenótipo basal, 67,5% receberam quimioterapia baseada em antraciclinas e taxanos.
O acompanhamento médio foi de 7,3 anos (variação de 0,0 a 11,1). A sobrevida livre de doença não foi significativamente prolongada com capecitabina vs observação (hazard ratio (HR) 0,82, 95% IC, 0,63 a 1,06, P = 0,1353). A sobrevida livre de doença em cinco anos foi de 79,6% (95% IC, 75,8% a 83,4%) com capecitabina e 76,8% (95% IC, 72,7% a 80,9%) com observação. A sobrevida global não foi estatisticamente diferente entre os braços de tratamento (HR 0,92; 95% IC, 0,66 a 1,28; P = 0,6228).
Na análise de subgrupo para SLD, não foi encontrada interação estatisticamente significativa entre o tratamento com capecitabina e diferentes subgrupos, com exceção dos fenótipos basais vs não basais (HR basal 0,97, 95% IC 0,72 a 1,32, P = 0,8620; HR não basal 0,51, 95% IC, 0,31 a 0,86, P = 0,0101, interação P = 0,0357). Resultados semelhantes foram encontrados para SG (HR basal 1,20, 95% IC 0,81-1,77, P = 0,3684; HR não-basal 0,48, 95% IC, 0,26-0,91, P = 0,0205; interação P = 0,0155). 75,2% dos pacientes completaram 8 ciclos de capecitabina, com uma mediana de intensidade de dose relativa de 86,3%.
"Ficamos desapontados ao descobrir que a adição de capecitabina adjuvante ao tratamento padrão não melhorou significativamente a sobrevida global ou livre de doença", continuou Martín. “No entanto, encontramos um subgrupo de pacientes com doença não-basal que parece ter um benefício significativo da capecitabina, e dados do estudo CREATE-X mostraram que a capecitabina adjuvante reduziu significativamente a taxa de recidiva e melhorou a sobrevida global quando administrada a pacientes com câncer de mama com doença residual após a quimioterapia neoadjuvante. Portanto, é recomendável que os oncologistas discutam sobre o uso de capecitabina adjuvante com seus pacientes com câncer de mama triplo-negativo”, observou.
De acordo com Martín, a principal limitação do estudo é o poder limitado para mostrar melhorias pequenas, mas clinicamente relevantes, no desfecho com capecitabina, devido ao tamanho da amostra e ao número menor que o esperado de eventos de recidiva no braço de controle.
“Houve uma tendência não significativa a favor da capecitabina, mas o estudo teve apenas 876 participantes, o que significa que não tinha poder estatístico para identificar diferenças pequenas, mas clinicamente relevantes”, observou Martín. “Uma possível razão para a discrepância nos resultados do estudo CREATE-X e do nosso estudo pode ser que as populações tinham características prognósticas diferentes; o risco de recidiva da nossa população foi muito menor do que no estudo CREATE-X”, observou.
Eventos adversos de grau 3 ou superiores foram observados em 40,4% dos pacientes no braço capecitabina. Em 9,6% dos pacientes os eventos adversos foram relacionados à capecitabina. A síndrome mão-pé foi o evento adverso mais comum no braço capecitabina (G3 em 18,8% dos pacientes).
Referência: Efficacy results from CIBOMA/2004-01_GEICAM/2003-11 study: A randomized phase III trial assessing adjuvant capecitabine after standard chemotherapy for patients with early triple negative breast câncer - Miguel Martín et al