Os desafios do diagnóstico e tratamento de sarcomas e outros tumores raros em cenários com recursos limitados foi tema da apresentação do patologista Antônio Nascimento (foto), médico do A.C.Camargo Cancer Center, em sessão educacional na ASCO 2018.
Segundo o especialista, a principal diferença no trabalho do diagnóstico histopatológico de sarcomas entre instituições médicas com recursos adequados em comparação com laboratórios que trabalham sob recursos limitados está na utilização de ferramentas auxiliares importantes, como imunohistoquímica e genética molecular. “O uso da imunohistoquímica é condição sine qua non para um diagnóstico correto e inquestionável de qualquer neoplasia mesenquimal. O uso apropriado de marcadores imunohistoquímicos, embora necessário, deve ser cuidadosamente interpretado em contexto com os aspectos morfológicos da neoplasia em questão. Questões relativas à sensibilidade e especificidade de alguns anticorpos devem ser levadas em conta”, explica. O especialista cita como exemplo a divergência entre sensibilidade e especificidade com o uso do CD99, um anticorpo extremamente sensível para sarcoma de Ewing/PNET, mas com baixa especificidade, colorindo outros tipos de células neoplásicas.
Cada dia mais comum na investigação diagnóstica de sarcomas é o uso de técnicas genéticas moleculares, FISH (Fluorescência In-situ hybridization) e/ou RT-PCR (reação em cadeia da polimerase de transcrição reversa). A introdução da genética na prática diagnóstica diária de sarcomas teve grande impacto em muitos aspectos, afetando especificamente o estudo da patogênese dos sarcomas, o desenvolvimento de esquemas de classificação, a prática diagnóstica e a determinação do prognóstico de algumas entidades sarcomatosas.
“A genética molecular tem se mostrado extremamente útil na rotina diária de laboratórios de patologia com recursos adequados. Semelhante ao uso da imunohistoquímica, os resultados derivados de técnicas de genética molecular devem ser cuidadosamente avaliados no contexto das características morfológicas da entidade neoplásica”, afirma.
O amplo domínio da patologia cirúrgica também é destacado, bem como a ênfase ao quadro clínico e às informações dos resultados laboratoriais e de imagem. É preciso considerar, entre outros aspectos, a idade e sexo do paciente, o sítio primário da lesão, o padrão metastático, se houver metástase, além de uma revisão cuidadosa dos achados radiológicos.
“Embora exceções ocorram, os sarcomas tendem a seguir alguns padrões em relação à distribuição por idade e sexo. Tumores como os neuroblastomas e variantes de células rabdomiossarcomas embrionárias e fusiformes afetam com maior frequência lactentes e crianças pequenas, enquanto sarcoma de Ewing/PNET, rabdomiossarcoma alveolar, sarcoma sinovial, condrossarcoma mesenquimal e sarcoma epitelioide têm uma tendência a acometer crianças mais velhas, adolescentes e jovens adultos”, exemplifica.
Em relação aos locais primários de envolvimento, a ênfase deve ser dada à localização para/medial dos neuroblastomas e à ocorrência frequente em tecidos moles profundos das extremidades observadas no sarcoma sinovial, no condrossarcoma mesenquimal e no rabdomiossarcoma alveolar.
Estudos de imagem são bem conhecidos por serem valiosos durante o diagnóstico de neoplasias ósseas malignas, e podem ser de grande ajuda também no diagnóstico de sarcomas de partes moles. “O sarcoma sinovial pode ser rico em calcificação, o que pode ser facilmente detectado por radiografias simples, e a presença de um crescimento de tecido mole rico em depósitos de cálcio mostrando um padrão floculoso denota um crescimento cartilaginoso e poderia indicar um condrossarcoma mesenquimal”, esclarece Nascimento.
Exame macroscópico e histológico cuidadoso
Embora hoje em dia os espécimes submetidos ao diagnóstico de possíveis sarcomas sejam pequenos fragmentos de tecido, por vezes os laboratórios de patologia recebem grandes amostras e órgãos inteiros para exame. Quando tal fato ocorre, um exame macroscópico cuidadoso da amostra é necessário para confirmar o diagnóstico de sarcoma.
Após o exame macroscópico, deve-se realizar um exame histológico cuidadoso, começando com a determinação do padrão de crescimento mostrado na neoplasia, conforme tabela abaixo.
Padrões de crescimento |
Tipos de neoplasia |
Diffuse |
Lymphomas, Ewing sarcoma/PNET, mesenchymal chondrosarcoma, small cell synovial sarcoma |
Cord-like with fibrosis |
Ewing sarcoma/PNET |
Nesting |
Neuroblastoma, DSRCT |
Staghorn |
Synovial sarcoma, mesenchymal chondrosarcoma |
Alveolar |
Alveolar rhabdomyosarcoma, alveolar soft part sarcoma |
Spindle/fascicular |
Synovial sarcoma, mesenchymal chondrosarcoma, embryonal rhabdomyosarcoma |
Biphasic |
Synovial sarcoma, malignant peripheral nerve sheath tumor, mesenchymal chondrosarcoma |
Outras características histológicas a serem consideradas durante o exame histológico de um sarcoma são presença e tipo de necrose, presença de mineralização, presença e tipo de estroma intercelular e presença e tipo de formação de matriz.
A necessidade de uma lista mínima de reagentes imunohistoquímicos para trabalhar sarcomas e seus diagnósticos diferenciais também foi destacada durante a apresentação. “Não é aceitável praticar patologia diagnóstica com neoplasias ósseas e dos tecidos moles se você não tiver um número mínimo de marcadores imunohistoquímicos disponíveis.
O especialista ressalta ainda a importância do trabalho multidisciplinar, além do reconhecimento das limitações do serviço caso seja necessário métodos auxiliares sofisticados de diagnóstico. “Os patologistas devem ser capazes de reconhecer sua limitação para fazer os diagnósticos corretos e, possivelmente, buscar ajuda cooperativa de instituições médicas com recursos adequados”, observa.