O oncologista Rafael Schmerling (foto), diretor científico do Grupo Brasileiro de Melanoma (GBM) e médico da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, analisa os resultados dos estudos em melanoma que foram destaque do programa científico da ESMO 2017. Os dados do estudo COMBI-AD mostraram que a combinação das terapias-alvo dabrafenib e trametinib duplica a sobrevida livre de recorrência no melanoma metastático estádio III em pacientes BRAF mutados. Em pacientes com melanoma ressecado estadio III/IV em alto risco de recorrência, o CHECKMATE 238 mostrou a superioridade do anti PD-1 nivolumabe em comparação com o ipilimumabe, atual padrão de cuidados.
Por muito anos, a única alternativa para tratamento adjuvante de melanoma foi o interferon. No seu desenvolvimento, houve grandes problemas que limitaram sua incorporação. Em primeiro lugar, ao longo de mais de três décadas, a avaliação de risco mudou de forma significativa. Além do aperfeiçoamento dos exames de imagem, o fenômeno do linfonodo sentinela levou a uma grande diversidade de risco nos pacientes com estágio III. O risco de morte varia entre 15% (IIIA) e 70% (IIIC), o que prejudica de forma importante qualquer interpretação.
Outro ponto importante é a toxicidade relacionada ao interferon. Na medida em que se tentou desenvolver uma estratégia com menos efeitos adversos, diversos estudos tentaram reduzir dose ou o tempo de duração. A multiplicidade de regimes impedia a comparabilidade e, em uma metanálise de casos individuais, não se conseguiu discriminar um regime que fosse superior. Por fim, o cenário do tratamento adjuvante em melanoma era o de uma utilização baixa, da ordem de 30%, com a plena aceitação de estudos que fossem feitos em comparação com observação.
Há dois anos, tivemos os dados do primeiro inibidor de checkpoint imune, ipilimumabe, no cenário adjuvante. Em comparação com placebo, ipilimumabe na dose de 10mg/kg reduziu o risco de morte em 25%. A principal crítica foi a dose elevada de ipilimumabe, o que implicava em uma taxa de 40% de eventos G3 e G4, além de 5 mortes (1%) relacionadas ao tratamento.
Assim, a expectativa recaía sobre os anti-PD1 e, na ESMO tivemos a apresentação do estudo CheckMate-238, que comparou nivolumabe na dose de 3mg/kg IV a cada duas semanas por um ano versus ipilimumabe na dose de 10mg/kg. O estudo incluiu 906 pacientes com melanoma IIIB, IIIC ou IV ressecado. O risco de recidiva com nivolumabe foi reduzido em 35% (HR 0,65, IC97,56% 0,51-0,83; p<0,001) na população em geral.
Entre os pacientes que tinham a expressão de PD-L1 < 5%, a redução de risco foi de 29% ao passo que na população com PD-L1 > 50%, a redução de risco foi de 50%. Além deste ganho, com clara significância, a toxicidade de nivolumabe foi consideravelmente melhor que ipilimumabe.
Outro estudo apresentado na ESMO 2017, o COMBI-AD trouxe um conceito inédito em melanoma: o uso de terapia-alvo no cenário adjuvante. A combinação de inibidores de BRAF (dabrafenibe) e MEK (trametinibe) por um ano foi comparada com placebo.
Foram incluídos 870 pacientes com melanoma BRAF-mutado, estágio III, cujo comprometimento mínimo seria o envolvimento nodal microscópico com mais de 1mm de extensão. Neste estudo, a redução de risco de recidiva com a terapia-alvo foi de 53% (HR 0,47; IC95% 0,39-0,58; p<0,001) e a redução do risco de morte foi de 43% (HR 0,57; IC95% 0,42-0,79; p=0,0006). Ao final de três anos, a diferença absoluta de sobrevida livre de recidiva foi de 19%, número pouco habitual para o tratamento adjuvante de qualquer tumor.
O desfecho primário de ambos os estudos foi sobrevida livre de recidiva, o que parece ser mais útil no cenário de múltiplos tratamentos que estamos observando em melanoma.
A discussão a respeito da escolha do primeiro tratamento de melanoma metastático BRAF mutado, entre terapia-alvo ou imunoterapia, será vista também no cenário adjuvante. Por um lado, o tratamento com inibidores de BRAF e MEK mostrou um grande impacto em recidiva e sobrevida global. Já nivolumabe reduziu o risco de recidiva em comparação com ipilimumabe, cujo ganho de sobrevida global frente a placebo era conhecido. Não se espera um estudo randomizado que possa discernir qual a melhor estratégia, restando somente a certeza que não haverá mais papel para interferon e nem ipilimumabe no tratamento adjuvante.
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