Nos últimos anos, os principais congressos têm destacado contribuições importantes e com impacto na prática da uro-oncologia. Na ASCO 2017 não foi diferente e estudos como o LATITUDE (LBA3) e o STAMPEDE (LBA5003) concentraram as atenções entre os highlights do programa científico. O oncologista Andrey Soares (foto), chair do LACOG-GU, analisa os destaques do panorama geniturinário apresentados no encontro de Chicago.
A apresentação do CHAARTED em 2014 mudou a conduta frente ao paciente com câncer de próstata metastático sensível a castração (CPSCm). Os pacientes passaram a receber bloqueio androgênico associado a 6 ciclos de docetaxel. O benefício de sobrevida global com esta estratégia foi da ordem de 13 meses (HR:0,73). Neste estudo, publicado no NEJM em 2015, os pacientes foram estratificados entre alto e baixo volume (alto volume: 4 ou mais lesões ósseas e/ou doença visceral). Muito se discutiu sobre esta divisão, uma vez que o benefício foi estrondoso nos pacientes com alto volume de doença, com ganho de 17 meses (HR:0,63), mas não apresentou ganho estatístico na doença de baixo volume.
O benefício da adição de docetaxel foi corroborado com a publicação do STAMPEDE, um elegante e complexo estudo inglês, com mais de 9 mil pacientes e 9 braços de avaliação. A análise que comparou o melhor suporte clínico (bloqueio androgênico) e melhor suporte clínico associado a 6 ciclos de docetaxel confirmou o ganho estatisticamente positivo de sobrevida em pacientes submetidos ao tratamento quimiohormonal, com aumento de 10 meses (HR:0,76). Neste estudo, pouco diferente do CHAARTED, também foram incluídos pacientes com doença localizada de alto risco (linfonodo positivo ou ≥ 2 de T3/4, PSA ≥ 40 ng/mL, G 8-10). Quando avaliados apenas os 61% de pacientes com doença metastática, o ganho de sobrevida global foi de impressionantes 22 meses (HR-0,73).
Assim como docetaxel na doença metastática resistente a castração, abiraterona também se mostrou eficaz neste cenário, com muito menos toxicidade, e não seria diferente na doença metastática sensível a castração.
Na ASCO 2017 foram apresentados os resultados dos estudos LATITUDE e STAMPEDE, este último um braço iniciado no final de 2011. Assim como docetaxel, a adição de abiraterona ao bloqueio androgênico nos pacientes com CPSCm mostrou ganho de sobrevida global estatisticamente significativo, ainda não atingido, mas com redução do risco de morte de 38% (HR:0,62).
Evidências
Diferentemente do CHAARTED, os pacientes do LATITUDE deveriam apresentar ao menos 2 dos critérios de doença de alto risco: G 8-10, doença visceral e 3 ou mais lesões ósseas.
O STAMPEDE corroborou os resultados do LATITUDE, mostrando redução do risco de morte de 37% (HR:0,63). No entanto, assim como no braço de docetaxel, apenas 52% dos pacientes apresentavam doença metastática. Os demais participantes do estudo tinham linfonodos positivos ou 2 de 3 critérios já expostos. Comparado ao braço de docetaxel do próprio STAMPEDE, a presença de doença metastática foi inferior, equivalente a 61% dos pacientes que receberam a quimioterapia.
Alguns pontos devem ser destacados sobre as diferenças entre LATITUDE e CHAARTED. No LATITUDE, 100% apresentavam doença de novo, enquanto no estudo com docetaxel essa população foi representada por 75% dos pacientes. A maior parte da população de alto risco do LATITUDE tem G ≥ 8 e mais que 3 lesões ósseas, sendo 17% de doença visceral versus 24% de doença visceral no CHAARTED.
Vale observar que o estudo LATITUDE foi interrompido prematuramente e tem tempo de seguimento mediano pequeno para avaliar a população de alto risco (30,4 meses). No entanto, diante da magnitude do benefício clínico, é improvável que o ganho não se perpetue em futuras análises.
Afinal, se o impacto na redução de risco é semelhante entre os trabalhos e se ainda não temos dados maduros do LATITUDE na doença de alto volume, será que poderemos escolher a melhor droga com base em dados clínicos?
Jovens com bom performance recebem quimioterapia, enquanto idosos ou pacientes frágeis recebem manipulação hormonal? Ambas são superponíveis e poderemos escolher a partir de critérios como toxicidade e/ou custo? Sem dúvida, ainda precisamos de biomarcadores para que esta escolha seja mais precisa.
Finalmente, os mecanismos de resistência aparecem conforme a doença progride e o tratamento evolui. Como serão esses mecanismos com tratamentos mais precocemente ofertados aos pacientes?
Apesar de algumas dúvidas, os resultados do LATITUDE e STAMPEDE trazem uma excelente notícia aos pacientes e mais uma opção efetiva para o tratamento do câncer de próstata metastático. No cenário da doença localizada ainda é preciso aguardar dados mais maduros para incorporar mudanças na rotina clínica.
Imunoterapia
No câncer renal, o estudo PROTECT (abstr. 4507) não demonstrou benefício em relação à recidiva e ainda somou toxicidade bastante importante, com impacto negativo na qualidade de vida. Apesar de 2 estudos ainda não conhecidos (SOR-
CE e ATLAS) acredito que já é hora de esquecer a adjuvância com TKI e aguardar os resultados com imunoterapia.
O estudo CHECKMATE-025 mostrou ganho de sobrevida global em segunda linha, após falha de TKI. Agora, os estudos de combinação se consolidam como tendência. O JAVELIN renal 100 (abstr. 4504), de fase Ib, avaliou a segurança e eficácia de avelumabe e axitinibe, demonstrando aumento de toxicidade com a combinação, porém com uma taxa de resposta bastante importante (54,5%).
Algumas associações, ao contrário, não se revelaram seguras. É o caso da combinação de pazopanibe e pembrolizumabe, que em novos dados apresentados na ASCO (abstr. 4506) frustrou expectativas.
No câncer de bexiga, depois de 30 anos sem drogas de impacto no cenário metastático, a chegada da imunoterapia pode reconfigurar a história natural da doença. KEYNOTE 045 (abstr. 4501) foi o primeiro estudo randomizado prospectivo de fase III a avaliar pembrolizumabe como tratamento de segunda linha em pacientes que progrediram à terapia com platina. Na ASCO 2017 os dados deste estudo foram atualizados e o benefício foi consistente e maduro, com sobrevida global acima de 10 meses na segunda linha e superior estatisticamente à quimioterapia. Definitivamente esta é a mudança de paradigma no tratamento dos pacientes com câncer de bexiga e esperamos ansiosamente sua aprovação no Brasil para esta indicação.
Leia a íntegra da análise do panorama GU.
Referências: