Os resultados de um ensaio clínico inicial (LBA3001) apresentados na ASCO 2017 mostraram que 33 de 35 pacientes (94%) pacientes de mieloma múltiplo apresentaram remissão clínica da doença após receberem imunoterapia com células CAR-T direcionadas à proteína de maturação de células B ou BCMA (LCAR-B38M CAR-T). A maioria dos pacientes teve apenas efeitos colaterais leves.
"Embora ainda seja cedo, esses dados são um forte sinal de que a terapia com células CAR-T pode promover remissão no mieloma múltiplo", disse o especialista da ASCO, Michael S. Sabel. "É raro ver taxas de resposta tão elevadas, especialmente para um câncer difícil de tratar”, acrescentou.
Os avanços recentes na quimioterapia tenham prolongado a expectativa de vida no mieloma múltiplo, este câncer permanece incurável. "Parece que com esta nova imunoterapia pode haver uma chance de cura, mas é preciso um acompanhamento muito mais longo para confirmar essa expectativa", disse o autor do estudo, Wanhong Zhao, diretor associado de hematologia no Second Affiliated Hospital da Xi'an Jiaotong University, em Xi'an, China.
A terapia com células CAR-T é feita de maneira individualizada para cada paciente. As próprias células T do paciente são coletadas, reprogramadas geneticamente e injetadas de volta no organismo. A reprogramação envolve a inserção de um gene projetado artificialmente no genoma da célula T, o que ajuda as células reprogramadas geneticamente a encontrar e destruir células cancerosas em todo o corpo.
Ao longo dos últimos anos, a terapia com células CAR-T que têm como alvo o biomarcador de células B chamado CD19 mostrou-se muito eficaz em ensaios iniciais para leucemia linfoblástica aguda (ALL) e alguns tipos de linfoma, mas até agora, houve pouco sucesso com a terapia CAR-T visando outros biomarcadores em outros tipos de câncer. Este é um dos primeiros ensaios clínicos da terapia CAR-T com o BCMA como alvo, que em 2004 se descobriu desempenhar um papel na progressão do mieloma múltiplo.
Métodos e resultados
O ensaio clínico de braço único foi conduzido para avaliar a segurança e a eficácia da abordagem. Um total de 19 pacientes com mieloma múltiplo refratário/recidivado foram incluídos. O número médio de células infundidas foi de 4,7 (0,6 ~ 7,0) × 10e6/kg. O tempo médio de seguimento foi de 208 dias (62 ~ 321).
Os autores relataram os resultados dos primeiros 35 pacientes com mieloma múltiplo recidivado ou resistente ao tratamento (refratário) matriculados neste ensaio clínico de fase I em curso na China. Os primeiros sinais de eficácia do tratamento apareceram 10 dias após a injeção inicial de células CAR T (os pacientes receberam três doses divididas ao longo de uma semana).
No geral, a taxa de resposta objetiva foi de 100% e 33 (94%) pacientes apresentaram remissão clínica evidente de mieloma (resposta completa ou resposta parcial muito boa) em dois meses após a receberem as células CAR-T.
Até o momento, 19 pacientes foram seguidos por mais de quatro meses, tempo pré-estabelecido para avaliação de eficácia total pelo consenso do International Myeloma Working Group (IMWG). Dos 19 pacientes, 14 atingiram critérios rigorosos de resposta completa (SCR), um paciente atingiu resposta parcial e quatro pacientes obtiveram remissão parcial (VgPR) considerada muito boa.
Houve apenas um único caso de progressão da doença com remissão parcial: uma lesão extramedular voltou três meses após desaparecer em exames de tomografia computadorizada. Não houve um único caso de recidiva entre os pacientes que atingiram resposta completa.
Os cinco pacientes que foram acompanhados por mais de um ano (12-14 meses) permanecem em resposta completa sem doença residual mínima (não possuem células cancerosas detectáveis na medula óssea).
A síndrome de liberação de citoquinas (CRS), um efeito colateral comum e potencialmente perigoso da terapia com células CAR-T, ocorreu em 85% dos pacientes, mas foi apenas transitório. Na maioria dos pacientes, os sintomas foram leves e manejáveis. A CRS está associada a sintomas como febre, pressão arterial baixa, dificuldade respiratória e problemas em múltiplos órgãos. Apenas dois pacientes neste estudo sofreram síndrome de liberação de citoquinas grave (grau 3), mas se recuperaram após receber tocilizumab (actemra, um tratamento de redução de inflamação comumente utilizado para administrar CRS em ensaios clínicos de terapia com células CAR-T). Nenhum paciente experimentou efeitos colaterais neurológicos, outra complicação comum e grave da terapia com células CAR-T.
Os pesquisadores planejam inscrever um total de 100 pacientes neste ensaio clínico, em quatro hospitais participantes na China. "No início de 2018, também planejamos lançar um ensaio clínico similar nos Estados Unidos. A ideia é verificar se a terapia com células CAR-T BCMA beneficia pacientes recém-diagnosticados com mieloma múltiplo", disse Zhao.
Referência: Abstract LBA3001: Durable remissions with BCMA-specific chimeric antigen receptor (CAR)-modified T cells in patients with refractory/relapsed multiple myeloma. - Frank (Xiaohu) Fan, Wanhong Zhao et. al - J Clin Oncol 35, 2017 (suppl; abstr LBA3001)