04122024Qua
AtualizadoQua, 15 Maio 2024 8pm

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Resposta à terapia neoadjuvante no câncer de mama

Filomena_SFBO_1_NET_OK_2.jpgA patologista Filomena Marino Carvalho (foto), Professora Associada e Livre-docente do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, fala sobre a avaliação histológica de resposta à terapia neoadjuvante no câncer de mama.

A determinação da resposta histológica do tumor às terapias sistêmicas neoadjuvantes no câncer de mama representa oportunidade ímpar de avaliação ”in vivo” da sensibilidade da neoplasia frente às diferentes opções de tratamento, permitindo assim propiciar uma abordagem personalizada. Além disto, esta informação tem particular utilidade nos ensaios clínicos, definindo de maneira acurada a resposta patológica completa, seu desfecho mais precoce. A resposta tumoral é determinada por características intrínsecas da neoplasia (subtipo molecular, heterogeneidade intratumoral) e pelo microambiente (fibroblastos/miofibroblastos, células endoteliais, sistema imune).

Para que a informação acerca da resposta tenha utilidade se faz necessária uma padronização adequada do método de estudo do tecido, reprodutível, e que permita definir se houve resposta patológica completa ou, caso contrário, informar de maneira precisa o volume e características da neoplasia residual.
 
O primeiro desafio para os patologistas frente aos espécimens submetidos a terapias sistêmicas está no reconhecimento do leito tumoral.  Nesta etapa é necessária correlação com os dados imaginológicos e cirúrgicos para identificação da área prévia do tumor, já que nem sempre ela é facilmente encontrada por ocasião do exame macroscópico do espécime. Recomendações para o adequado processamento desses espécimes têm sido amplamente divulgadas1,2. Em espécimes pouco volumosos (tamanho até 5,0 cm e/ou peso até 30g), após identificação da área do tumor prévio, seja através de alteração macroscópica evidente, seja através da informação da sua localização, deve ser mapeada e inteiramente estudada histologicamente. Em espécimens maiores podem ser selecionados fragmentos a espaços regulares, a cada 1-2 cm da área tumoral, por exemplo. Caso não seja identificado tumor residual nestes fragmentos, novos cortes são realizados.
 
No exame microscópico alguns sinais indicam regressão tumoral, tais como edema estromal, fibroplasia, presença de histiócitos xantomatosos ou com pigmento de hemossiderina, células inflamatórias e calcificações distróficas. Entretanto, alguns casos não mostram nenhum sinal histológico evidente. Nos casos em que há neoplasia residual, deve ser determinada a sua celularidade, comparando-se com aquela apresentada por ocasião da biópsia prévia ao tratamento, e a carga tumoral. O reconhecimento das células neoplásicas nos apresenta, por vezes, alguma dificuldade, sobretudo em casos com baixa celularidade e com células que exibem alterações degenerativas e regenerativas. Células tumorais podem ser confundidas com células epiteliais não neoplásicas, células endoteliais e células estromais. Outra dificuldade na interpretação histológica é a definição do compartimento em que as células neoplásicas se encontram, ou seja, infiltrativas no estroma (carcinoma invasivo residual verdadeiro), dentro de vasos linfáticos (embolização neoplásica) ou dentro de ductos (componente “in situ”). Nestas circunstâncias o exame imunoistoquímico tem papel decisório. Células epiteliais expressam algumas citoqueratinas, histiócitos expressam marcadores como CD163 e CD68, células endoteliais dos vasos expressam podoplanina (D2-40) e células mioepiteliais ao redor dos ductos expressam vários marcadores (calponina, p63, CD10, SMMHC, etc..).
 
A presença de embolização vascular, ainda que sem carcinoma invasivo residual, não deve ser classificada como resposta patológica completa2. A presença do componente “in situ” deve ser sempre relatada, embora sua inclusão ou não na definição de resposta patológica completa seja controversa. Recomenda-se que esta definição seja acordada entre os clínicos e patologistas, sobretudo nos ensaios clínicos.
 
Em relação aos linfonodos, todos aqueles retirados cirurgicamente devem ser inteiramente submetidos a exame histológico. Qualquer volume de neoplasia residual, incluindo células tumorais isoladas e micrometástases, não deve ser classificado como resposta patológica completa.  Além disto, recomenda-se que toda área do linfonodo com sinais de regressão tumoral (mais comumente fibroplasia) deve ser mensurada e informada no relatório1,2.
 
Existem vários sistemas de classificação histológica: ypTNM (AJCC/UICC); NSABP B18; Chevalier; Japanese Breast Cancer Society; Miller-Payne; Escore tumoral de Sataloff; Fórmula de determinação de doença residual em mamas e linfonodos (RDBN) (0.2 X tamanho do tumor em cm + estádio linfonodal (0–3) + grau histológico (1–3)); Carga de tumor residual do M.D. Anderson (RCB), e Carga proliferativa de tumor residual Proliferative Cancer Burden. Estes sistemas variam principalmente quanto a incluir ou não o componente “in situ”, forma de determinação do volume de tumor residual, e inclusão ou não do linfonodo. Evidentemente, qualquer sistema pode ser utilizado, desde que explicitado no relatório e acordado entre os membros da equipe.
 
Classificada a doença residual, recomenda-se, a critério clínico, que a expressão de receptores hormonais e de HER2 seja repetida, pois estes podem sofrer mudanças significativas após o tratamento3. Em estudo com 21.755 mulheres do Japanese Breast Cancer Registry, houve mudança em 4,5% dos tumores RE-positivos, 9,3% dos RE-negativos, 18,7% dos RP positivos, 9,3% dos RP-negativos, 21,45% dos HER2 positivos e 3,4% dos HER2-negativos. No subgrupo HER2 superexpresso tratado pelo trastuzumabe a mudança foi de 24,7%3.
 
Em tumores tratados com terapias neoadjuvantes o estudo do Ki-67 através de imunoistoquímica tem papel como valor preditivo de resposta patológica e valor prognóstico na biópsia pré-tratamento, e valor prognóstico no espécime pós-tratamento.
 
No ensaio neoadjuvante GeparTrio, valores de Ki-67 pré-tratamento foram categorizados em grupos <15% de células positivas; 15,1-35% e >35%, obtendo-se diferenças significativas nas taxas de resposta patológica completa (quase 30% com tumores com >35% vs.<5% para tumores <15%). Neste estudo, altos valores de Ki-67 estiveram associados a tumores de pior prognóstico4. Talvez mais do que os altos valores de Ki-67 pré-tratamento, a sua redução após neoadjuvância tem se associado a melhor prognóstico, sobretudo nos tumores com maior atividade proliferativa (luminal B, HER2 e triplo-negativos)5.
 
Taxas de resposta patológica completa, sobretudo em carcinomas receptor hormonal-negativos, associam-se à presença de linfócitos intratumorais6-8. Em meta-análise conduzida por Wang et al. que incluiu 23 estudos com 13.10 pacientes, altos valores de linfócitos intratumorais se associaram a aumento nas taxas de resposta patológica completa em relação aos tumores com baixos valores (OR 2,81, p<0,001), sobretudo no subgrupo de carcinomas triplo-negativos (OR 4,67, p<0,001)6.
 
Em súmula, a avaliação histológica da resposta tumoral neoadjuvante deve seguir padronização no processamento dos espécimes, reportar o sistema utilizado e informar as características do tumor residual em tecido mamário e linfonodos: volume de doença, sinais de resposta e características biológicas (grau histológico e perfil imunoistoquímico). 
 
Referências bibliográficas
1.         Bossuyt V, Provenzano E, Symmans WF, Boughey JC, Coles C, Curigliano G, et al. Recommendations for standardized pathological characterization of residual disease for neoadjuvant clinical trials of breast cancer by the BIG-NABCG collaboration. Ann Oncol. 2015;26(7):1280-91.
 
2.         Provenzano E, Bossuyt V, Viale G, Cameron D, Badve S, Denkert C, et al. Standardization of pathologic evaluation and reporting of postneoadjuvant specimens in clinical trials of breast cancer: recommendations from an international working group. Mod Pathol. 2015;28(9):1185-201.
 
3.         Niikura N, Tomotaki A, Miyata H, Iwamoto T, Kawai M, Anan K, et al. Changes in tumor expression of HER2 and hormone receptors status after neoadjuvant chemotherapy in 21,755 patients from the Japanese breast cancer registry. Ann Oncol. 2016;27(3):480-7.
 
4.         Denkert C, Loibl S, Müller BM, Eidtmann H, Schmitt WD, Eiermann W, et al. Ki67 levels as predictive and prognostic parameters in pretherapeutic breast cancer core biopsies: a translational investigation in the neoadjuvant GeparTrio trial. Ann Oncol. 2013;24(11):2786-93.
 
5.         Matsubara N, Mukai H, Fujii S, Wada N. Different prognostic significance of Ki-67 change between pre- and post-neoadjuvant chemotherapy in various subtypes of breast cancer. Breast Cancer Res Treat. 2013;137(1):203-12.
 
6.         Wang K, Xu J, Zhang T, Xue D. Tumor-infiltrating lymphocytes in breast cancer predict the response to chemotherapy and survival outcome: A meta-analysis. Oncotarget. 2016.
 
7.         Mao Y, Qu Q, Chen X, Huang O, Wu J, Shen K. The Prognostic Value of Tumor-Infiltrating Lymphocytes in Breast Cancer: A Systematic Review and Meta-Analysis. PLoS One. 2016;11(4):e0152500.
 
8.         Loi S, Michiels S, Salgado R, Sirtaine N, Jose V, Fumagalli D, et al. Tumor infiltrating lymphocytes are prognostic in triple negative breast cancer and predictive for trastuzumab benefit in early breast cancer: results from the FinHER trial. Ann Oncol. 2014;25(8):1544-50.
 

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