Em mais um tópico da coluna ‘Drops de Genômica’, o oncologista André Murad (foto) comenta trabalho publicado no Annals of Oncology, o maior estudo de sequenciamento de exoma de câncer de mama hereditário já realizado até o momento, que comparou 2.135 casos com 51.377 controles e demonstrou ser bastante improvável que um novo gene de câncer de mama exista em qualquer frequência populacional apreciável. Confira.
Por André Marcio Murad*
É bem reconhecido atualmente que a arquitetura genética da suscetibilidade ao câncer de mama abrange um amplo espectro genômico, desde polimorfismos comuns que conferem individualmente pequenos riscos até genes de maior suscetibilidade ao câncer de mama (BCSGs).
Estima-se que aproximadamente 41% do risco hereditário de câncer de mama já tenha sido decifrado. Dos 23% atribuíveis a variantes gênicas, a maioria é representada pelos genes BRCA1 e BRCA2 (17%), com outros BCSGs também já bem estabelecidos (PALB2, ATM, CHEK2, TP53, STK11, PTEN, NF1, CDH1, BARD1, RAD51C e RAD51D) que representam coletivamente cerca de 6% dos casos. Estima-se que 18% do risco genético de câncer de mama compreendam variantes comuns identificadas por estudos de associação do genoma (GWAS), e outros 23% sejam potencialmente identificáveis por GWAS mais extensos. Dos 59% dos casos de risco hereditário inexplicável, mais da metade (36%) é, portanto, potencialmente atribuível a variantes raras até então não identificadas.
Entretanto, o maior estudo de sequenciamento de exoma de câncer de mama hereditário já realizado até o momento, que comparou 2.135 casos com 51.377 controles, demonstrou ser bastante improvável que um novo gene de câncer de mama exista em qualquer frequência populacional apreciável.
O estudo, conduzido por Loveday e colaboradores e recentemente publicado na revista Annals of Oncology, realizou o sequenciamento do exoma dos 2.135 casos para identificação da carga genética de variantes deletérias raras contra 51.377 controles populacionais pareados por etnia do gnomaAD (Genome Aggregation Database). Os 2.135 casos de câncer de mama invasivo foram recrutados por meio do estudo de suscetibilidade ao câncer de mama e ovário e os critérios de elegibilidade foram: sexo feminino, BRCA-negativo, etnia europeia branca e um dos seguintes fatores adicionais: (i) história familiar de câncer de mama, (ii) doença bilateral, (iii) idade jovem de início (<30 anos) e (iv) câncer de ovário concomitante.
A análise final dos dados encontrados concluiu ser improvável que um novo gene de câncer de mama (Risco Relativo ≥ 5) exista em qualquer frequência populacional apreciável.
Esta é a maior análise de caso-controle de câncer de mama com utilização do sequencianento do exoma germinativo publicada até o momento. Embora possam existir genes adicionais de suscetibilidade ao câncer de mama, estima-se que os mesmos sejam de baixa penetrância, ou de alta penetrância, mas com uma frequência mutacional muito baixa. Por conseguinte, há controvérsias em relação à utilidade clínica e pertinência da pesquisa rotineira de tais genes, mesmo que futuramente eles sejam identificados.
*André Murad é diretor científico do Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão (GBOP), diretor clínico da Personal - Oncologia de Precisão e Personalizada, professor adjunto coordenador da Disciplina de Oncologia da Faculdade de Medicina da UFMG, e oncologista e oncogeneticista da CETTRO Oncologia (DF)