Pedro Moraes (foto), oncologista do Centro Paulista de Oncologia (CPO), do Grupo Oncoclínicas, e médico do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, discute como o uso de neoadjuvância pode ajudar a selecionar melhor a terapia adjuvante no câncer de mama com receptores hormonais positivos HER2 negativo, de acordo com o tipo de resposta obtida na primeira fase do tratamento.
Pedro Moraes (foto), oncologista do Centro Paulista de Oncologia (CPO), do Grupo Oncoclínicas, e médico do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, discute como o uso de neoadjuvância pode ajudar a selecionar melhor a terapia adjuvante no câncer de mama com receptores hormonais positivos HER2 negativo, de acordo com o tipo de resposta obtida na primeira fase do tratamento.
O câncer de mama com receptores hormonais positivos é o subtipo mais comum de neoplasia mamária e pode corresponder a até 80% dos casos. Apesar de ser o mais prevalente, quando o assunto é neoadjuvância os outros grupos de tumores de mama têm maior destaque.
As evidências mais antigas trazem a ideia de que fazer neoadjuvância ou adjuvância com a mesma quimioterapia leva ao mesmo prognóstico, visto o resultado do NSABP-18. Porém, este estudo não leva em questão as quimioterapias mais modernas. O NSABP-18 se baseou em doxorrubicina e ciclofosfamida (AC) como única quimioterapia. Além disso, não existia avaliação nem tratamento específico para doença Her2 enriquecida. Este estudo já deixa claro que o uso de quimioterapia neoadjuvante aumenta a probabilidade de cirurgia conservadora1. O tipo de cirurgia realizada pode não trazer impacto no prognóstico oncológico, mas existem dados que demonstram que mulheres que fazem cirurgia conservadora têm maior qualidade de vida do que as que fazem cirurgia radical2-4.
Neste contexto, vale repensar os objetivos e indicações de neoadjuvância. O principal objetivo é melhorar o resultado cirúrgico, administrando terapia sistêmica efetiva. Usualmente indica-se neoadjuvância para mulheres com câncer de mama com estádio clínico III ou IIB desde que T3. Para o estadio II, a neoadjuvância fica reservada aos casos em que a relação mama/tumor é desfavorável e a indicação é a cirurgia radical. Desta forma, a neoadjuvância pode proporcionar a conversão de uma cirurgia radical para uma cirurgia conservadora.
Outro objetivo da neoadjuvância que muito se discute é obter resposta patológica completa. Existem diversos dados correlacionando a resposta patológica completa à melhora significativa de prognóstico, especialmente nos tumores de mama triplo negativos ou Her2 positivos. A resposta patológica completa (RCB 0 ou RCB 1) é um marcador de menor significância prognóstica entre os tumores com receptores hormonais positivos, considerando que a taxa de resposta patológica completa é muito menor nestes tumores, relatada em 20% dos tumores dos subtipos luminal tratados com quimioterapia.
Um dado de significância prognóstica que muitas vezes passa desapercebido é a variação do Ki67 com o tratamento neoadjuvante. Quanto maior a queda do Ki67 pré-tratamento para o pós-tratamento, maior o impacto prognóstico positivo. Alguns dados até sugerem que pacientes que mantêm elevado Ki67 no pós-neoadjuvância podem ser candidatas a tratamento adjuvante mais agressivo5.
Quando se fala em tratamento neoadjuvante usualmente pensa-se em quimioterapia. As quimioterapias mais utilizadas neste grupo de paciente são AC (doxorrubicina e ciclofosfamida) dose densa por 4 ciclos seguido de taxano ou TC (docetaxel e ciclofosfamida). Mas, neste grupo de tumores de mama, pode-se utilizar neoadjuvância hormonal. A neoadjuvância hormonal é mais bem tolerada do que a quimioterápica. A hormonioterapia neoadjuvante é mais bem indicada para pacientes na pós-menopausa com tumores que apresentam receptores de estrogênio Allred 7 ou 8 e baixo Ki67. Neste grupo, a resposta clínica com letrozol pode chegar a 60%6. Os dados demonstram que os inibidores de aromatase têm maior taxa de resposta do que tamoxifeno7. No grupo das pré-menopausadas os dados são menos consistentes e também fortalecem o uso dos inibidores em associação com goserrelina em dose mensal6. Os dados de inibidores de CDK4/6 no contexto neoadjuvante ainda são extremamente imaturos. Os estudos PALLAS, EarLEE-1 e monarchE estão avaliando o uso de palbociclibe, ribociclibe e abemaciclibe, respectivamente, em adjuvância. Estes estudos estão em andamento.
Outro tratamento não quimioterápico que vem ganhando força é talazoparib para pacientes com mutação BRCA1 ou BRCA2 germinativa. Este fármaco vem sendo testado em neoadjuvância com mais de 50% de resposta patológica completa, mas este dado mistura tumores com receptor hormonal positivo (minoria no grupo) com tumores triplo negativo8. Os estudos maiores que estão em andamento poderão avaliar de forma mais clara se este será um tratamento utilizado na prática clínica8.
O uso de neoadjuvância pode ajudar a selecionar melhor a terapia adjuvante de acordo com o tipo de resposta patológica obtida na primeira fase de tratamento5. Este raciocínio ficou estabelecido em tumores do tipo triplo negativo com o estudo CREATE-X9 e Her2 positivo com o estudo KATHERINE10. Retomando os tumores com receptores hormonais positivos, o estudo Penelope-B avalia adjuvância com hormonioterapia padrão ou em associação com palbociclibe para as pacientes com doença residual após neoadjuvância quimioterápica. O estudo OlimpiA avalia um ano de olaparibe adjuvante para pacientes com doença residual após quimioterapia e mutação germinativa de BRCA1 ou BRCA2, tanto em pacientes com receptores hormonais positivos quanto em receptores hormonais negativos. Estes dois estudos estão em andamento. O estudo POTENT III avaliou associar S-1 à hormonioterapia tradicional para mulheres com doença residual. O estudo foi apresentado no último congresso de San Antonio com resultado positivo, demonstrando um HR 0,63 (95% CI, 0.49-0.81; P <.001) para tempo livre de doença invasiva com seguimento de 51 meses.
Existem alguns dados sobre modificar a terapia neoadjuvante de acordo com a resposta que a paciente apresenta. O estudo GeparTrio iniciou tratamento com docetaxel, doxorrubicina e ciclofosfamida (TAC) por 2 ciclos e reviu resposta. As pacientes que apresentaram progressão após os dois ciclos (662) foram randomizadas para manter o protocolo ou trocar por vinorelbina e xeloda. Este último grupo apresentou melhor sobrevida livre progressão com HR 0,59 (p: 0,001)11.
Levando-se em consideração todos estes dados, se a paciente tiver indicação absoluta de quimioterapia, este tratamento pode ser feito na neoadjuvância. Esta estratégia pode auxiliar em um tratamento cirúrgico menos agressivo e propiciar uma estratificação melhor do prognóstico das pacientes. Com os dados futuros, ainda poderá auxiliar em uma melhor seleção da adjuvância a ser seguida. No caso de dúvidas sobre a indicação quimioterápica, recomenda-se seguir com o tratamento cirúrgico e, possivelmente, uma assinatura gênica para definir melhor o risco de recidiva e, possivelmente, poupar a paciente de quimioterapia.
Autor: Pedro Moraes, oncologista clínico do Centro Paulista de Oncologia (CPO), do Grupo Oncoclínicas, e do Hospital Israelita Albert Einstein - Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
Referências
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